Experimento Noir é um espaço de troca de experiências e experimentos que bebam da fonte do gênero noir.
Participe para saber mais e envie a sua colaboração. Após análise, publico com crédito do experimentador.


sábado, 2 de abril de 2011

Cartazes - In Dark Passage - 1947






In Dark Passage (Prisioneiros do Passado - 1947)

Dark Passage (1947)
Prisioneiros do Passado
106 min - USA
Film-Noir | Thriller
Delmer Daves


Bogart e Bacall são os protagonistas deste Noir com diversos elementos do gênero e curiosamente, altera a sequência de acontecimentos fatais com um final feliz.

Na São Francisco dos anos 40, Vincent Pary é um homem condenado por assassinar sua esposa, mas escapa da prisão, a fim de provar sua inocência. Para circular livremente, faz uma cirurgia plástica que lhe mudará o rosto.



Delmer Daves mantém boa parte do filme não só descrito em primeira pessoa, mas os acontecimentos vistos pelos olhos do suposto fugitivo, mudando apenas ao recuperar-se da cirurgia e ganhar um novo rosto, este na figura de Bogart.

Recuperado após uma estada na casa da bela Irene (Bacall) que acredita em sua inocência, - devido a morte de seu pai na prisão em condições semelhantes - Vincent adota um novo nome e sai em busca de provas que desvendem o verdadeiro criminoso de sua mulher e em seguida, o melhor amigo.



Numa trama de intrigas, chantagens e mortes, Vincent descobrirá aos poucos o verdadeiro assassino ainda que não lhe reste outra solução a não ser partir por não ter provas de inocentar-se. Mas o final surpreende pelo fato de Vincent convidar Irene, a mulher que o cuidou e por quem vê-se envolvido, a encontrá-lo em um lugar agradável onde supostamente podem iniciar uma nova vida.



Apesar do filme possuir vários elementos do noir, pareceu-me dos mais leves além de situações bastante convenientes, como a moça que espontaneamente o ajuda a fugir quando da fuga da prisão além de dar-lhe abrigo durante a recueração da cirurgia.

Mostra fotográfica "Nova York anos 40", de Andreas Feininger


Nova York, Los Angeles, San Francisco são alguns dos cenários onde as tramas Noir desenrolam-se.

Passeando pelas dicas de entretenimento para o fim de semana e sempre envolvida com temas que associam-se de algum forma ao gênero, vai a dica da primeira exposição na América Latina, no Museu Lasar Segall, do fotógrafo Andreas Feininger, com a mostra "Nova York anos 40".


Segundo informaçõs do museu, trata-se de "um recorte da cidade de Nova York nos anos 1940. Olhar extraordinário para a paisagem urbana, e de uma avidez visual insaciável. Os amplos planos são reveladores do registro da grandeza da modernidade de uma megalópole como Nova York, com todos os contrastes que a constituem."

A respeito das fotografias, diz Feininger: “Interessou-me tudo aquilo que foi criado pelo homem: desde a maquinária, até os prédios ou os aviões e, particularmente, interessa-me a cidade, embora de uma forma integral. Gosto de mostrar tudo como um conjunto: os carros, os sinais de trânsito, os edifícios e qualquer outra coisa presente”, diz Feininger em entrevista poucos anos antes de sua morte, em 1999, e aos 92 anos de idade.





Exposição organizada pelo Arquivo Andreas Feininger Tübingen, Alemanha a/c Museu Zeppelin Friedrichshafen e Museu Lasar Segall

Rua Berta, 111 - V. Mariana
Terça a sábado e feriados, das 14 às 19h
Domingos das 14 às 18h

Mais detalhes: http://www.museusegall.org.br/mlsItem.asp?sSume=19&sItem=342

O pastiche ou apropriação - uma análise sobre o noir na atualidade - Parte III

Finalmente chegamos ao terceiro e último post onde analisamos a apropriação do gênero Noir como tendência na atualidade.

Vimos os comentários de estudiosos, posições negativas quanto a apropriação, sendo o pastiche uma forma "cega" e "vazia", reduzida a imitação, outras que enxergam como uma renovação e até mesmo uma necessidade da contemporaneidade, devido à condição de estranhamento em relação ao momento vivido, buscando no passado referências que possam explicar ou dar sentido a este que hora participamos e hora nos distanciamos.

Em uma primeira análise, podemos ver no Noir uma forma de filmar que, circulando por diversos estilos, apropriou-se de algumas de suas características atribuindo-lhe uma roupagem nova culminando na associação de elementos do gênero em si.


The Big Combo - 1955

A meu ver, o Noir já transitava pela apropriação e fez surgir um gênero carregado de experimentação da técnica cinematográfica, além de ter a liberdade de exibir uma temática muito próxima do momento vivido - relembrando, as condições sociais nos Estados Unidos diante do Crash da Bolsa e a Segunda Guerra em seguida - e todo o clima sombrio carregado de dúvidas, desconfiança e incerteza eram o reflexo do sentimento que pairava no país e adiante, no mundo.

Já o ressurgimento nos últimos 25 anos do gênero, trazido em parte pelos meios acadêmicos e jornalísticos, surgindo produções que apropriam-se das técnicas e estilo com consequente interesse do público ao ponto deste tornar-se cult nos faz pensar quais fatores levaram a tal redescoberta, e quero crer que não se trata apenas de um bom trabalho da mídia.

Primeiramente, fala-se no interesse pela alta qualidade técnica e fotográfica além do tema realista. Ma não podemos nos esquecer da existência na atualidade da corrupção e insegurança, as dúvidas quanto ao período em que vivemos, em constante e acelerada mudança.


The Maltese Falcon - 1941

A angústia extende-se ainda em relação ao ambiente urbano onde ambição, egoísmo e materialidade predominam, com diferenças sociais e a decadência dos valores morais que geram uma forte insegurança entre o homem e seu meio, outra forte identificação que refere-se a temática do Noir pela semelhança do sentimento e condições do indivíduo desde a origem do estilo. Talvez essa gama de fatores permitam uma comparação em relação à época do surgimento deste gênero cinematográfico.

Pensando no cinema e seu papel como entretenimento, podemos analisar a tendência em algumas produções na atualidade, carregadas de efeitos especiais e nem sempre com conteúdo, além da promoção constante de atores e atrizes como símbolos e referências de estilo. Esses são outros fatores que podem explicar o retorno ao passado e resgate de uma arte de estética refinada, dotada de alta criatividade técnica e temática mais próxima da realidade, livre dos estereótipos que mascaram a condição humana.


Side Street - 1950

O Noir atende ao entretenimento, mas fala do humano e a ameaça que a cidade e outros elementos, como por exemplo a figura feminina, provocam, sem sentimentalismos ou máscaras que encubram suas deficiências, em especial as morais. Com técnica meticulosamente dirigida, mostra o lado sombrio da humanidade, trazendo à luz a verdade.


Out of Past - 1947

Numa sociedade em que a imagem se faz mais importante do que nossa essência, vivendo em um ambiente de concreto frio que parece refletir-se no comportamento humano, no Noir, a máscara extingue-se ao revelar o que se passa no interior das mentes, nos redimindo e nos aproximando da essência humana, buscando refletir sobre a real condição em que vivemos.

Mauro Baptista, doutor em Artes pela USP, diz que o “Noir significou, na época, um revigoramento do cinema americano” e que “os filmes Noir eram um lugar de experimentação numa época onde o cinema americano dominava o mercado mundial”. (Revista Quem Fev/2006). O cinema americano dominante de que ele fala eram os glamourosos e otimistas musicais que buscavam camuflar a situação social vigente.

Quero crer que a apropriação do gênero na atualidade está mais próxima da análise acima, assim como a de Giorgio Agamben, sobre a tendência no contemporâneo de resgatar sentido no passado para entender o momento atual. Penso ainda que o retorno do Noir trouxe um revigoramento e renovação do estilo, tal como acontece em diversos campos como a moda, por exemplo, onde o homem consegue, a partir de referências do passado, trazer à tona a lembrança e uma nova visão a respeito.

Esta é a opinião desta que escreve. Permito que o leitor aproprie-se ou participe desta análise ou discorde totalmente, discutindo a respeito.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Cartazes - Double Indemnity / Body Heat

Post em dose dupla com cartazes dos filmes citados no post sobre pastiche ou apropriação, em que Frdric Jameson fala do plágio presente na remontagem na atualidade do clássico de Billy Wilder.










O pastiche ou apropriação - uma análise sobre o noir na atualidade - Parte I

Pastiche ou apropriação é definido como obra literária ou artística em que se imita grosseiramente o estilo de outros escritores, pintores, músicos, etc.
Pode ser plágio com sentido pejorativo, ou é uma recorrência a um gênero. É ainda uma espécie de colagem ou montagem, tornando-se uma paródia em série ou colcha de retalhos de vários textos. Antes de tudo, é um procedimento que mescla estilos.

Pensando no Noir clássico e a tendência no contemporâneo da apropriação do estilo, pretendemos analisar o porque dessa retomada, ciente do processo pelo qual passou o gênero quando de sua retomada pela mídia e público, chegando a categoria de cult em diversos grupos.

Segundo Mauro Baptista, doutor em artes da USP, “O Noir, em sua época, não foi tão valorizado. Eram filmes que iam sendo feitos e não eram percebidos como conjunto. Nos últimos 25 anos, houve um enorme número de publicações sobre o Noir - jornalística, acadêmica, de pesquisa. Ele foi muito retomado pelo cinema moderno. O Noir tem uma fotografia excepcional, de grandes contrastes de luz e sombras. E não tem esse triunfalismo, esse final feliz, das produções classe A americanas, nem essa coisa melodramática, sentimentalóide. Isso fez com que o Noir ficasse cult.”

Diversos estudiosos analisam o pastiche ou apropriação demonstrando suas conclusões a respeito.

Para Fredric Jameson, o pastiche apropria-se das imagens e as manipula como imitação ou com fim estético ou lúdico. É forma “cega” ou “vazia”, destituída de padrões morais, sem referências claras pela fragmentação e explosão de estilos já todos criados, reduzido a “reabilitação nostálgica do passado”.

Jameson, ao falar do pastiche e a moda da nostalgia, refere-se ao cinema citando o filme Corpos Ardentes (Body Heat, 1981 - EUA) como uma remontagem do clássico Pacto de Sangue (Double Indemnity, 1944 - EUA), sendo “o plágio alusivo e fugidio de tramas mais antigas...uma característica do pastiche”.



Hasan e Compagnon apresentam-se mais otimistas, o primeiro encarando o pastiche como colaboração para a criação de algo novo ao evocar estilos de outras épocas e Compagnon vendo-o como o rejuvenescimento da tradição no rastreamento e conjugação de diferentes estilos.

Giorgio Agamben analisa a condição do homem contemporâneo, e considera haver um descompasso entre o homem e seu tempo, causando estranheza e incompreensão, onde o entendimento do momento vivido pede uma postura de participação e distanciamento, e não situando-se no presente, busca-se no passado referências para dar-lhe sentido.

Entendendo que o Noir clássico surgiu com uma postura de certa liberdade quanto à aplicação e experimentação das técnicas e temática realista, revelando o lado sombrio da sociedade, vemos na atualidade um ressurgimento do gênero por parte de público e crítica, inicialmente atraídos pela temática crua e qualidade técnica, talvez levados por uma identificação com boa parte das características que o constituem. No próximo post, veremos mais sobre os filmes citados, seguindo com uma conclusão pessoal mais a frente.

Referências

JAMESON, Fredric, Pós-Modernidade e Sociedade de Consumo. In “Novos Estudos CEBRAP”, nº 12, São Paulo, 1985.
HASAN,Ihab.The question of Postmodernism.Apud ROSE, 1993.
COMPAGNON, Antoine. La seconde main ou le travail de citation. Paris: Éditions du Seuil,1979.
AGAMBEN, G. O que é contemporâneo? e outros ensaios. Argos. 2009.
Pastiche: http://pt.wikipedia.org/wiki/Pastiche
Revista Quem (Fevereiro 2006).
http://revistaquem.globo.com/Quem/0,6993,EQG1122610-3428,00.html

O pastiche ou apropriação - uma análise sobre o noir na atualidade - Parte II

Seguindo com os comentários sobre a apropriação ou pastiche defendido por Fredric Jameson, citando Corpos Ardentes como "plágio" alusivo de Pacto de Sangue, pretendo neste post falar um pouco dos 2 filmes para que o leitor possa analisar e tirar por si algumas conclusões, analisando a tendência da apropriação do gênero, trazendo de volta um estilo para os dias atuais.

Double Indemnity (1944)
107 min - EUA
Crime | Film-Noir | Thriller
Billy Wilder

“Fiz por dinheiro e por uma mulher. Fiquei sem o dinheiro e também sem a mulher.”, diz Walter Neff (Fred MacMurray).


Assim conclui o protagonista do clássico Pacto de Sangue, quando da chegada a seguradora onde trabalha e resolve gravar sua confissão como criminoso, iniciando assim toda a trama deste engenhoso filme.

Walter Neff chega ao edifício onde trabalha. Em sua sala, ferido e sangrando, grava sua confissão de assassinato ao gerente e amigo Barton Keyes, o que fez por dinheiro e por uma bela mulher, a Sra. Phyllis Dietrichson com quem se envolvera poucos meses antes, ao procurar seu marido, na mansão da família, para renovar o seguro de seus carros.


Seduzido por Phyllis desde o primeiro momento em que a vê, Neff começa a pensar no crime do marido indesejado que fora sugerido por Phyllis, baseado em seu conhecimento sobre seguros de vida.


O crime parece perfeito, cada detalhe é repassado minuciosamente pelos amantes até a consumação do ato, porém, como todo bom clássico noir, nenhum ato vão sairá impune, e vemos o desenrolar do medo, ansiedade, desconfiança, tomando conta dos personagens levando a um clima tenso e angustiante.




Em um roteiro bem estruturado e uma bela fotografia, Wilder e o detetive romancista Raymond Chandler constróem uma grande obra, baseada na história de um crime ocorrido em março de 1927, em Nova York, envolvendo a dona-de-casa Ruth Snyder e seu amante, Judd Gray, um vendedor de 32 anos.

Pacto de Sangue é um filme carregado de elementos Noir, entre eles o perseguido, - vemos na maior parte do tempo tentando não ser descoberto pelo sagaz chefe Barton Keyes (Edward G. Robinson) - a femme fatale Phillis, a mulher sedutora que conquista o personagem Neff e o manipula ao ato do crime. A narrativa em primeira pessoa com flashback do personagem declarando os fatos do crime, a fotografia com predomínio do ambiente escuro, as cenas quase sempre noturnas. Vemos ainda a cena urbana em ambientes amplos e a projeção da luz das janelas sobre o protagonista e criminoso, como que marcando um enclausurado em sua própria angústia.




A ambiguidade dos personagens é nítida, como no caso de Neff que incomoda-se com as sugestões não declaradas de Phyllis para que este cometa o assassinato do marido, única solução, segundo ela, de obter a herança, até que cego de desejo resolve concordar e prepar um plano detalhado com base na experiência do corretor de seguros a fim de resultar em um crime acima de qualquer suspeita que permita a remuneração como resultado final.

A figura do chefe de Neff (Barton Keyes), veterano investigador de seguros, inflexível e capaz de identificar qualquer reivindicação desonesta, é o homem que parece deixar-se levar pela amizade não desconfiando em nenhum momento do amigo e parceiro de trabalho.

Em Pacto de Sangue não é a câmera que envolve o espectador acompanhando a trama pela ótica do criminoso, mas a narrativa que mostra ao longo do filme o ponto de vista de A Neff sobre o decorrer dos acontecimentos.

“O cara que você procurava estava muito perto Keyes, do outro lado da sua mesa”. “Mais perto que isso Walter”. “Também te amo Keyes”. Este diálogo final mostra a amizade entre os detetives, ainda que Keyes cumpra ao final seu dever entregando Neff para a polícia, mesmo que o criminoso já acreditasse estar a beira da morte.




Body Heat (1981)
113 min - EUA
Crime | Drama | Thriller
Lawrence Kasdan

Corpos Ardentes parece ser sem dúvida uma remontagem do clássico de 1944, tal como compara Jameson.

Ned Racine é um advogado de uma cidade pequena na Flórida que conhece Matty Walker, mulher de um magnata que costuma viajar a negócios. O encontro os leva a tornarem-se amantes e em seguida planejarem a morte do rico marido Edmund, a fim de que possam estar livres para permanecem juntos e com a fortuna da qual Matty tornaria-se herdeira.


Alguns traços marcantes que apresentam-se no Noir, como a fotografia contrastada e tomadas de câmeras não convencionais não se apresentam em Corpos Ardentes. O “plágio” descrito por Jameson está no tema, onde os amantes planejam o assassinato do marido indesejável a fim de tomar para si a herança. O desfecho, porém, difere no fatalismo de Pacto de Sangue com a morte dos amantes. Em Corpos Ardentes, a fuga da esposa que realiza o sonho de viver em um ambiente exótico em grande estilo, deixando o cúmplice atrás das grades - este percebendo ter sido manipulado desde o momento do encontro até as juras intensas durante os encontros sexuais - acaba por demonstrar um desfecho não menos fatalista, ainda que apenas para um dos lados, deixando ainda um gosto cínico e amargo de que o crime compensa (pelo menos para alguns, não é, Matty?).


Recomendo aos leitores que assistam aos dois filmes e analisem a tendência da apropriação sobre a ótica de Jameson mas também dos já citados na primeira parte desta análise. Tirem suas conclusões e descrevam em seguida aqui em nosso espaço para mais discussões.